A linha vermelha - Exploração off-shore de petróleo
Existem poucos assuntos que me posso declarar como especialista, para quem não sabe o que eu faço e qual foi a minha militância para além da partidária/ideológica, dificilmente poderá compreender o quanto me faz espécie e/ou me mete impressão a abordagem superficial neste assunto, não só porque o conheço profundamente como e até porque a nível de especialidade, de observação e estudo me dediquei às energias e à sua exploração marítima desde que me comecei a interessar por assuntos ligados ao mar e a militar na Greenpeace Internacional.
Um dos atos de coordenação em que participei nesta organização foi o de organizar na Galiza voluntários que chegavam de todo o mundo para a limpeza do Chapapote - palavra que resumidamente descreve o que se limpava nas praias da Galiza, ou seja, alcatrão/asfalto oleoso e/ou crude e que provém de uma palavra índia do dialeto náhuatl/asteca: chapopotli - resultantes do acidente e afundamento do petroleiro Prestige - petroleiro que se afundou em 13 de novembro de 2002 ao largo da Galiza com bandeira Liberiana, mas de uma empresa Suíça - onde estive durante meses não só na organização como na limpeza ativa de cerca de 50 mil toneladas deste elemento das praias da Galiza, mas que afetou também milhares de quilómetros de praias situadas na costa norte da península em quase todo o Mar Cantábrico, ou seja das Astúrias, Cantábria e do País Basco, chegando até ao Golfo da Biscaia e às praias portuguesas do Minho.
Também meti a mão na massa e foi impressionante limpar toneladas de crude e pior, ver que milhares de aves maritímas, peixes e animais de todas as espécies incluindo mamíferos - como golfinhos e pinguins - a morrerem e que centenas de quilómetros de costas rochosas foram afectadas sem que lhes conseguissemos tocar e que milhares de famílias perderam o seu sustento durante anos pois houve uma quebra total em áreas como a apanha de bivaldes e a pesca onde centenas de bancos de pesca e/ou habitas maritimos sofreram perdas que duraram quase uma década a recuperar bem como as explorações de aquacultura então já muito abundantes nas dezenas de baias que a costa atlântica da Galiza detém.
A somar a este desastre podemos juntar outro, mais recente - de 2010 - o da plataforma marítima Deep Horizon que ocorreu no Golfo do México, onde esta exploração petrolífera off shore estava a realizar a fase final da perfuração de um novo poço a 1500 metros de profundidade e que entre 20 de abril de 2010 - data em que esta plataforma explodiu afundando-se 2 dias depois - e 17 de julho de 2010 - data em que alegadamente a BP referiu que pôs válvulas que estancaram o derrame continuo - libertou 780.000 metros cúbicos de crude e/ou 3,2 biliões de barris de crude afetando uma área de 68 mil milhas marítimas e afetando os recursos pesqueiros e bancos de pesca bem como a biodiversidade marítima por pelo menos uma década.
Os relatórios são esmagadores neste campo, só na área mais afetada haviam 8332 espécies que ficaram seriamente afetadas, morrendo milhões de espécimes e provocando uma interrupção brutal no fluxo de plancton no Golfo do México que continua a afetar as reservas de espécimes marítimas não só devido ao crude libertado como também ao uso dos dispersantes que afetaram esta cadeia.
E porque vos falo destes dois casos, porque são potenciais exemplos do que pode ocorrer futuramente na fase de exploração e transporte marítimo de crude nas costas portuguesas.
É que estes dois casos não são exemplos que nunca existiram nem que foram distantes e/ou impossíveis de se repetirem, são atuais e mensuráveis e infelizmente com condições marítimas atlânticas que são muito similares às da costa portuguesa.
E o problema é que o retorno financeiro desta atividade, um dos fatores que apontam para a defesa da exploração de Petróleo em Portugal está entre o modesto e o ridículo e não acrescentaria mais do que uns miseráveis centésimos de PIB em cada ano, aliás num artigo publicado no DN, por Ricardo Paes Mamede, este afirma:
"O modesto retorno que se pode esperar para o país não decorre apenas da quantidade de petróleo que possa existir. Decorre também das condições previstas nos contratos de concessão em vigor. De acordo com esses contratos, o Estado Português receberia uma modesta percentagem do valor do petróleo produzido (entre 3% e 7%, em função das quantidades extraídas, no caso dos contratos do litoral alentejano), depois de descontados todos os custos de pesquisa e desenvolvimento dos campos petrolíferos e os custos operacionais. Os contratos estipulam também que a contrapartida para o Estado só começaria a ser paga depois de integralmente cobertos os custos de investimento.
Se tomarmos por referência as previsões de médio prazo para o preço do petróleo, as quantidades produzidas em países próximos e os custos standard envolvidos neste tipo de operações, rapidamente se conclui que o Estado português não ganharia mais do que algumas centésimas do PIB em cada ano (já incluindo as receitas de impostos). Mais problemático ainda, as empresas concessionárias têm uma responsabilidade limitada nos custos de eventuais acidentes ambientais, os quais teriam de ser assumidos pelo Estado e pelas populações e empresas afetadas."
Este economista pega neste artigo no segundo ponto que me opõe frontalmente a esta exploração off-shore de petróleo na costa Portuguesa que são as condições de exploração e/ou contratos, não só o retorno financeiro é diminuto para o estado, ou seja para todos nós, como os contratos estabelecem nulas e/ou fortemente baixas contrapartidas e responsabilização no caso de haver um acidente ambiental.
Absurdo, quando se tem como principio geral na legislação portuguesa o do poluidor-pagador, ou seja, quem polui paga, deste modo estes contratos têm como principio uma exceção inadmissível ainda mais numa atividade que se tiver algum acidente irá afetar de forma perene e permanente uma grande variedade e multiplicidade de áreas, sejam estas de biodiversidade como económicas, sociais e/ou ambientais. Tal desresponsabiliza legalmente essas empresas no pagamento de eventuais indemnizações transferindo para o estado, ou seja, para todos nós esses encargos porque o estado não impõe principios tão básicos que são gerais para todos os empresários e empresas deste país.
Para além disso nos contratos há outro problema, que neste artigo não foi referido, que é o não uso do principio da precaução, deixando ao critério de quem explora o uso ou não desse principio o que é perigoso pois este tipo de exploração envolve muitos custos e caso se possa poupar na segurança tanto melhor para quem explora, mas não para as zonas diretamente afetadas.
Por fim iremos ao ultimo assunto e que é aquele que marca a minha oposição frontal a este tipo de exploração, e que é contido na resposta a esta pergunta:
Será que vale a pena numa opção puramente política arriscar o nosso futuro tendo como contrapartida alguns anos de independência externa petrolífera?
Antes demais quero-vos falar das vantagens de exploração de petróleo em Portugal que se resumem a apenas dois aspetos importantes, uma potencial independência energética de produtos petrolíferos nos próximos 10 a 20 anos e a poupança - via não importação - e eventual ganho marginal de impostos.
Esmiuçando o primeiro, tal uso deste argumento como vantagem é falacioso, pois nada nos contratos de exploração - pois não o poderia restringir - implica que o petróleo produzido em Portugal, seria consumido e/ou para uso nacional a probabilidade seria aliás fortemente a contrária.
O segundo argumento é verdadeiro, mas se tivermos em conta o potencial da poupança e dos ganhos com os custos contínuos e a perda de eventuais receitas por causa da poluição constante que provoca esta atividade, veremos que dificilmente tal será compensatório.
É que esconder que há uma constante poluição dos derrames frequentes e constantes resultantes da exploração desta atividade e que esses derrames que dão à costa frequentemente e implicam também uma constante limpeza é o mesmo que tapar o sol com a peneira, até porque não se contabiliza nem o que isso poderá afetar turisticamente as regiões afetadas - tendo no topo as costas algarvias e a costa vicentina - nem os problemas que afetarão os recursos piscícolas e/ou custos ambientais diretos e indiretos dessa poluição constante.
Em segundo lugar temos considerar o que é uma opção política e se esta pode ser tomada apenas com base em achismos, ou seja, se o que o Primeiro-ministro e secretário-geral do meu partido acha que é melhor para o país e que o nosso partido defenda deve ser aceite sem debate interno e pior sem tomar em consideração todos os pontos de vista, até aqueles que como eu defendem esta posição particular - e que não se resume apenas a mim pois sei que centenas de militantes me acompanham nesta oposição - ou outros que são dirigentes e autarcas das regiões/concelhos fortemente afetados por esta decisão e que nas próximas eleições autárquicas irão perder o mandato por causa desta decisão irresponsável tomada por militantes lobistas pagos e que se movem dentro do nosso partido com selo de respeitabilidade e que na realidade servem nos últimos tempos como caixa de ressonância desta decisão.
Lamento que opções políticas desta natureza não levem em conta três pressupostos:
1.º Documentos internos que vinculam este secretário-geral e primeiro-ministro e que nos levaram a o apoiar como candidato a secretário-geral e nosso candidato a primeiro ministro nas próximas eleições;
2.º Discussão política franca e aberta interna sobre se esta decisão é apoiada pelos milhares de militantes do PS e as bases a que este deve respeito como secretário-geral, bem como os órgãos que entre congressos e eleições governam o partido;
3.º Democracia interna, pois após esta discussão franca e aberta se por maioria for tomada por esses órgãos e/ou apoiada maioritariamente pelas bases que compõem o PS quem representa essa minoria, tem duas soluções, ou se submete e fica ou sai referindo que tal decisão não se coaduna com os seus valores e princípios.
Então falemos destes três pontos:
1.º Este Secretário-geral foi a Congresso com uma Moção Global de Estratégia intitulada Moção Geração 20-30 (que pode ser acedida AQUI), esta moção não só não fala sobre este ponto como e especificamente diz que a estratégia deve ser exatamente a contrária, cito o que é referido na página 7 desta: "Cumprimos na promoção da sustentabilidade ambiental, vinculando o país ao ambicioso Acordo de Paris, aumentando de forma expressiva a potência instalada em energias renováveis, incluindo a aprovação de uma estratégia para as energias renováveis oceânicas." E na página 11 em que se afirma que: "O desafio que temos pela frente exige-nos que pensemos de forma integrada em tantos e tão diversos domínios. Temos que ter um território mais coeso e mais resiliente, temos que estar na linha da frente da transição energética para as fontes de energia renováveis.". Ainda e aliás neste ponto a Moção tem um capitúlo inteiro o 3.1 dedicado às "Alterações Climáticas" e vários sub-capitúlos em que este assunto tão importante estratégico poderia ser tocado e/ou focado como o 3.1.2 com o titulo "Liderar a transição energética" em nenhum destes e em toda a Moção este assunto é focado, havendo como é obvio afirmações contrárias como as aqui reproduzidas que dão estocada de morte a este desígnio;
2.º Não houve nenhuma discussão política em relação a este assunto e porquê, porque se a houvesse com grande probabilidade havia uma forte oposição política interna não só de autarcas e bases militantes que os apoiam como de várias centenas de militantes que não estando integrados nessas àreas iriam se opor. Acrescento que a abrir-se uma discussão interna sobre esse assunto esta chocaria com a Moção que esmagadormente os militantes votaram e porque este secretário-geral e candidato a primeiro-ministro foi eleito, pelo que até nesse ponto esta discussão não poderia ter lugar pois órgãos entre congressos não podem por em questão documentos aprovados nesse Congresso. Já tivemos um Secretário-geral que tentou tal passe de mágica e que teve grandes dissabores internos, não queira este voltar aos tempos de um segurismo recauchutado e felizmente enterrado como um período negro da história do PS recente;
3.º Como a segunda opção nunca ocorreu e se ocorresse seria contrária a uma linha apoiada em Moção e votada de forma esmagadora por um Congresso Nacional eu nem ponho à discussão os pontos seguintes que referi, ou seja, que eu e outros eventualmente teríamos que optar em ficar ou sair.
Podemos então concluir que neste ponto não houve uma opção política e muito menos alguma discussão política e que achismos não são o que movem um partido nem muito menos marcam a agenda deste, daí que é melhor o Secretário-geral e atual primeiro-ministro repensar bem a sua posição, pois o seu achismo tem muito pouco opção e muito de lobismo que não foi caucionado nem em congresso nacional nem pelos órgãos coletivos do partido e é preciso muito mais do que páginas do Facebook patrocinadas por ENI´s e/ou GALP´s que estão a convidar militantes do PS a magote para nos convencer do contrário.
Fica o aviso os militantes do PS não estão à venda neste campo!!!
Por fim temos que considerar, na pergunta que coloquei, qual o futuro e se esse futuro vale a pena ser arriscado por uma opção política, e aqui podemos dividir este ponto em dois.
O primeiro é o que é o futuro de Portugal, da União Europeia - espaço onde nos integramos economicamente - e do mundo no campo das energias e focando-nos neste âmbito nas fontes de energia, será que é na exploração do Petróleo, ou pelo contrário no uso das energias renováveis e na transição para uma sociedade descarbonizada!!!
Vamos citar de novo a Moção que nos vincula enquanto coletivo partidário - inclusive o atual primeiro-ministro e atual secretário-geral e órgãos coletivos entre congressos - que refere que: "(...) incluindo a aprovação de uma estratégia para as energias renováveis oceânicas. (...) O desafio que temos pela frente exige-nos que pensemos de forma integrada em tantos e tão diversos domínios. Temos que ter um território mais coeso e mais resiliente, temos que estar na linha da frente da transição energética para as fontes de energia renováveis.".
Tenho deste modo a certeza - e não acho nada - que as anteriores citações responderam à minha pergunta e que riscaram completamente do mapa e para o lixo da história a opção de exploração de petróleo off-shore, aliás até nem seria racional como país optarmos agora por um retrocesso civilizacional e muito menos como partido fazermos marcha atrás em tudo o que o PS implementou e tudo o que o tornam o partido central das políticas verdes em Portugal.
E neste ponto faço aqui um parêntesis, não sou eu atualmente nem as centenas de militantes e autarcas que estamos mal, nesta opção espúria apoiada por lobismos de exploração de petróleo off-shore mas sim quem a defende e como já referi atrás, quem está mal pode submeter-se à maioria ou sair do partido e ir para o CDS-PP, que é um partido que acha que o nosso futuro poder ser encaixotado face a lobis de energia!!!
O segundo ponto tem a ver com se vale ou não a pena ver o nosso futuro arriscado por e com essa opção política que como eu já aqui referi nem sequer existe no PS a não ser na cabeça de certos lobistas que agem dentro do PS e no achismo do nosso primeiro-ministro e secretário-geral que por estes foi influenciado.
Arriscar o futuro de certos sectores económicos já implantados como por exemplo o Turismo que vivem da garantia que a limpeza das costas é um dos seus Ex-libis de atração e que gera mais de 10% do PIB nacional e mais de um milhão de postos de trabalho por centésimas de crescimento no PIB e impostos que mal irão dar para cobrir os custos eventuais dessa exploração é absurdo.
Para não falar de que a poluição gerada irá obrigar Portugal, ao abrigo das regras europeias a pagar como poluidor e produtor de fontes de energias não renováveis e que provocam o agravamento do efeito de estufa e não a poupar como atualmente poupamos e tudo porque uns certos lobistas que acham - continuamos no achismo - que isso é bom para o futuro.
Qual futuro? O deles com certeza!!! Pois o do país não será!!!
Concluo com um aviso à navegação a esses lobis, não pensem que nos podem colocar sob factos consumados, vindo com tretas que contratos de prospecção são iguais a contratos de exploração, lamento informar quem assim pensa e julga que o não prosseguimento de contratos de prospeção darão lugar a multas por não passarem à fase de exploração, já li e reli os mesmos e em nenhum lugar refere que estes contratos vinculam o estado português a obrigar a assinar outros para serem explorados estes recursos, aliás a lógica é simples, pois se essa obrigação houvesse essa seria também obrigatória para quem não encontrando nada teria que explorar mesmo não encontrando nada!!!
Deste modo se for anunciado que vão ser explorados esses recursos, é porque este governo do PS, que está vinculado ao seu Partido e em que este aprovou de maneira esmagadora, numa reunião magna uma moção que rechaça esse caminho, assinou novos contratos e que esses contratos vão contra essa moção e a esse caminho que se comprometeu.
Eu sei que muitos julgam e acham - outro achismo - que quem combate militantemente pelo PS internamente e externamente apenas o fará sempre por causa do providencialismo de certos líderes, apenas aviso esse líder e quem o rodeia, que se esses novos contratos de exploração forem assinados que irá acontecer uma de duas coisas:
1.º O achismo esbarra com a oposição frontal até dentro dos órgãos nacionais do PS e tais contratos nem sequer serão assinados;
2.º A maioria do PS adormecida acha que quem tem esta posição, igual à minha e de centenas de militantes e autarcas, deve sair pois diante do facto consumado da assinatura dos contratos menoriza este nosso pensamento, indo contra não só o futuro do país como à Moção que vincula este partido e o atual secretário-geral e candidato a primeiro-ministro, e acha que nós devemos defender essa posição lá fora, noutro partido criado de novo e ou sob outro partido já existente.
Apenas ficam a saber que isso está a ser preparado e que provavelmente será num ano péssimo para que aconteça, ou seja, em ano de eleições autárquicas em que o PS perderá algumas dezenas de câmaras e centenas de militantes.
Até porque quem rasgou o compromisso connosco e não cumpriu a Moção porque foi eleito, não fomos nós mas sim quem acha - mais uma vez os achismos - que a palavra dada não é palavra honrada!!!
Fica apenas o aviso para os que acham e não os que agem!!!
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