terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

O bom e o mau turismo...

 


   








   O turismo é bom, enche de alegria, da vida há cidade, recomendasse. Oh leitor, a quanto te engano!

  O boom turístico levou Portugal aos melhores mapas de recomendação a visitar. Descobrimos que o turismo é algo fenomenal, e trás dinheiro, trás gente e coloca o país na esfera das grandes empresas. Como diria o senhor da pastelaria, "eles vêem gastar, para ficar e quem sabe investir". Sem consequências de maior. A cidade sabe receber os nossos visitantes. o discurso do tempo em que as porções mágicas faziam efeito era menos enganador que o discurso do turismo.

  Lisboa é um dos exemplos que o turismo é bom, mas o excesso é preocupante. Uma cidade cada vez menos Portuguesa, mais distante dos seus cidadãos, onde tudo é pensado para "estrangeiro ver". Os bairros tipicamente alfacinhas, que tanto gosto dava sentir o cheiro tão nosso, hoje são aromatizados com perfume francês, cerveja Alemã e o bom whisky britânico. Sem duvida que o cheiro a sardinha, típico da Mouraria, hoje tem mais cheiro a Caviar Russo.

  Que dizer da música de Zeca Afonso, "em cada esquina um amigo"? Não, em Lisboa em cada esquina um Hotel, em cada rua um Hostel, em cada rosto um despejo e em cada despejo um fundo imobiliário a sorrir. Lisboa perdeu a imagem de Alfacinha. Mais fácil se vê uma salsicha alemã ou um bacalhau norueguês que um tipo que diga dez palavras em português.

  Lisboa faz um Português se sentir estrangeiro sem nunca ter passado a fronteira. E quem diz Lisboa, diz o Porto. Já lá vai o tempo em que a pronúncia do Norte era uma coisa tão nortenha, tão portista. Hoje a pronúncia do Norte é apenas uma música dos GNR escrita num álbum do passado. Trocar o "v" pelo "b" é mais raro no porto do que trocar um fino por beer. É estranho, é anormal o país ser tomado por uma fonte tão grande de receita que permita que as características das cidades e a sua principal identidade, as pessoas, possa ser posta em causa.

  Dizer que o turismo é necessário, que trás mais valias e que é benéfico em todos os sentidos é desmistificar as consequências do descontrolo total a que chegou o turismo. Minimizar as suas consequências é entregar aos moradores dos centros da cidade a carta para o despejo antecipada, sem que as autarquias, também elas movidas pelos interesses financeiros, possam fazer parte da solução. 

  O turismo em excesso coloca a sustentabilidade das cidades em causa. As autarquias e os países retiram benefícios a curto prazo, criando impactos futuros muito mais gravosos. Para além dos centros das cidades poder ficar, no futuro, com sequelas do impacto do efeito de centrifugação dos que obrigados pelos abusos de aumento das rendas foram obrigados a sair do centro da cidade, os efeitos sobre o valores das casas também serão, sem dúvida, o efeito borboleta na economia local, e no caso de Lisboa, com forte efeito na nacional. 

  Aguardar tranquilamente enquanto o país encaixa dividendos com o turismo, sem que sejam tomadas medidas sérias para evitar futuros riscos sociais e económicos, é a demonstração da má prática politica e da falta de medidas que nos transportou para a fragilidade económica actual. Pensar no presente sem assegurar consequências futuras e deixar que a situação se agudize durante largos períodos de tempo é a total ausência de um padrão politico capaz. 

  Enquanto o turismo "devora" as nossas cidades a saque de fundos imobiliários e da especulação, vamos sobrevivendo como verdadeiro país de terceiro mundo à espera que este tempo passe e nos deixe cidades vazias, casas desvalorizadas, hotéis fechados e um quinhão de história desaparecida nos escombros de cidades que perderam a sua gente e a sua identidade. 

  Um pensar pequeno com consequências grandes. 

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