E as regalias vitalícias?
Em período de dizer-mos “adeus”, já
há muito desejado ao nosso presidente da república, Cavaco Silva, surge de novo
a controvérsia em redoma das regalias dos ex-presidentes.
Tendo em conta o estado do país, onde
possuímos uma taxa de desemprego elevadíssima, com a emigração dos jovens,
precariedade, elevada pobreza, défice económico e dívida pública elevada, não
me parece ajustado as premissas que abordaremos à frente.
Parece-me que as próximas condições
respeitantes aos vencimentos e regalias dos ex-presidentes são uma “mera”
contradição, em comparação com aquilo que o povo vive e sobrevive nos dias de
hoje. Mas as condições de distribuição dos rendimentos são totalmente desiguais
na sociedade. A distribuição factorial tem um problema enorme nas sociedades,
acentuado pela falta de homogeneidade existente.
Falemos então do que se passa. As
subvenções vitalícias já são há muito tema de crítica social, e mantém-se. Um
ex-presidente da república possui uma subvenção vitalícia de 80% do salário de
um Presidente em funções. Recebem “quase na totalidade” o vencimento que auferiam
em funções. Relembro ainda, que o mais gritante é que àquela subvenção ainda se
acumula toda e qualquer pensão de aposentação, reforma ou sobrevivência que
estes tenham direito.
As subvenções são uma invenção
excelente, criada por políticos, para a protecção dos seus próprios direitos. O
comportamento humano, a ideia de querer algo para si, dispondo de meios e de
estatuto para o fazer, meramente por cinco anos ou dez anos do seu trabalho,
são contraditórios quando existem portugueses que trabalham durante quarenta ou
mais anos, auferindo pensões ou salários de miséria.
Isto parece um contra-senso com as
funções que já desempenharam no passado, sendo que após o seu término é
inadequado receberem qualquer vencimento, só por terem cumprido uma função
política. Claro que em período de funções têm direito a receber o seu
vencimento, embora na minha opinião, não necessitava de ser tão elevado. Tal
com o povo, também quando está num emprego dito por “normal”, após o seu
término não recebe uma subvenção vitalícia sobre o mesmo. Aqui deveria ocorrer
o mesmo. Trata-se de o desempenho de funções, que só deveria ser reavidas, tal
como os cidadãos comuns, aquando da altura da sua aposentação, sem que fosse
algo adquirido com subvenção.
Mas se isto já corrói, então
vejamos mais regalias, que não só vencimento. Se a quantia elevada do
vencimento não chega, ainda possuem uma regalia respeitante a possuírem
automóvel do Estado, para seu serviço pessoal, bem como combustível também pago
pelo Estado. Tradução, os nossos impostos estão a ser canalizados para que
exista um carro e combustível, para alguém que já não exerce funções, se possa
se deslocar em âmbito pessoal.
Mas não há uma sem duas, nem duas
sem três. E a terceira condição é a de possuírem um gabinete de trabalho, sendo
que para além da infra-estrutura, ainda têm direito a um assessor e um
secretário, à sua escolha. Ou seja, mais dinheiro dos contribuintes para
fornecer a infra-estrutura, bem como duas pessoas que nem passam pela “vista”
do Estado na sua escolha.
Ainda para além disto têm direito a
livre-trânsito, a passaporte diplomático nas deslocações para o estrangeiro,
bem como uso e porte de arma de defesa. Isto traduz ainda mais uns quantos
“bons” euros para sustentar estas “regaliazinhas”.
Bem a soma é astronómica, sendo
cerca de 300 mil euros ano a cada ex-presidente.
Depois quando me dizem que não há
dinheiro para aumentar os apoios sociais, a quem realmente não tem
possibilidade por vezes de ter os bens sociais básicos, como alimentação,
electricidade, CSI, RSI, abono de família, entre outros, mas há margem de
dinheiro para que estes senhores possam não só possuir um vencimento brutal,
bem como de possuir regalias extras. Não vá 80% do salário de ex-presidente ser
pouco.
Falo que no total dos ex-presidentes,
Ramalho Eanes, Mário Soares e Jorge Sampaio gastamos na ordem de um milhão de
euros com todos. Ainda juntando Cavaco Silva, vai chegar à ordem de um milhão e
200 mil euros. Coisa pouca, aquilo que gastamos com quatro, reforço quatro,
pessoas, que são antigos chefes do Estado, mas que já não exercem funções.
Mais interessante, é que Cavaco
Silva conta mudar-se para um convento, em Alcântara, fazendo de lá o seu
gabinete de trabalho, e para além de toda a infra-estrutura ser paga
mensalmente pelo Estado, também a reabilitação estará na ordem dos 475 mil
euros. Não é a primeira vez que as obras de reabilitação de uma infra-estrutura,
que fará de gabinete de trabalho de um ex-presidente, necessita de
reabilitação, bem pelo contrário aquela soma de um milhão e 200 mil euros, que
irá ser gasta este ano pelo Estado, também se soma esta valor “mínimo”, ao ver
de quem proletariza estas regalias “ridículas”.
Acho que chega a ser revoltante
para qualquer cidadão, que esteja no desemprego, no limiar da pobreza, a viver
em condições desumanas, e até mesmo quem está empregado, veja esta quantia
exorbitante que é paga para uma pessoa fora das suas funções, e até mesmo em
funções, que simplesmente após cessar funções não “trabalha” directamente para
nada do Estado. Chegam a ser periclitantes estas condições de associação
criadas.
Hoje em dia discutimos no nosso
país até ao último centavo a escolha de uma medida por outra no orçamento de
estado, só para que não tenha tanto impacto orçamental, mas este tipo de
regalias nunca é discutido. Não me lembro nunca de ninguém sequer ter posto em
causa estas regalias e estes vencimentos, que poderiam ser perfeitamente
reduzidos, senão mesmo eliminados, em detrimento de outras medidas que na
realidade tenham impacto na vida dos cidadãos portugueses.
É uma revolta ver estes números, é
uma revolta olhar para um país que mais uma vez segue uma ordem de benefício de
certas categorias ou funções “profissionais” em detrimento de outras. Mais uma
vez sinto que é uma vergonha viver neste país que não preserva quem vive nele……