segunda-feira, 7 de março de 2016

Fazemos no futebol, o que somos na vida

  



   O mundo do futebol português é uma nítida imagem da escassez dos valores como sociedade. No futebol, tal como na vida, o fracasso é um obstáculo no sucesso, mas culpa de terceiros. Nunca exigimos melhor da equipa,nunca aceitamos que não jogaram o suficiente, ou não foi eficaz. O treinador, para nós,  não falha, o presidente não excede, é o arbitro que tem culpa da derrota, é o arbitro a culpa do fracasso. Como na vida, os políticos que escolhemos, é que são os culpados do fracasso como sociedade, não cada um de nós.
  O Sporting e Benfica defrontaram-se no estádio de Alvalade. O que seria suposto ser um jogo que deliciaria as famílias, um hino ao futebol, é um folclore de fanatismo, troca de ofensas entre adeptos e confrontos físicos entre alucinados. Um local onde as famílias, que deveriam viver o futebol naturalmente, não são aconselhadas a entrar. Onde qualquer uma pessoa pode correr o risco da sua integridade física.
  Não é nos adeptos que começa a arder a fogueira, é nas televisões que despejam diariamente quantidade enormes de futebol, que se rega com gasolina o clima. Das coberturas excessivas de futebol em larga escala, às conferências de imprensa em directo, com treinadores e presidentes a trocarem ofensas, completamente desnecessárias, que passa para os adeptos torna, que não conhecem limites a sanidade desportiva nem conhecem a cultura desportiva do respeito entre as instituições, toda aquela agressividade e vontade de fazer estragos.
    Não esquecer os comentadores, que vão produzindo discursos em tom provocativo com incentivo à violência. Convidados por  audiências, pois transportam o discurso necessário para o canal, e provoca o pior que existe em adeptos mais sensíveis, os mais fanáticos.
   Presidentes que se comportam como adeptos fanáticos, ou rufias, lançam a lenha para a fogueira que já é o futebol.
   Um clima ensurdecedor onde claques que partilham ofensas e ameaças, onde famílias não têm lugar nos estádios por prevenção, são jogos considerados de "alto risco". As zonas circundantes estão limitadas ao cidadão, questões de segurança. O clima de agressividade vivido entre clubes de futebol não pode ser, em qualquer circunstância, um impedimento e limitação à liberdade de circulação.
  No entanto, o que se verifica é o abuso de poder praticado por adeptos, que em grupo, atropelam os direitos fundamentais de qualquer outro cidadão.
  Nenhum portista vai passear para Lisboa, vestido com a camisola do clube, em dia de um clássico, tal como os benfiquistas estão proibidos de festejar em plena avenida publica dos Aliados. Em dia de derby, qualquer pessoas que se vista de vermelho está limitada a passar no Campo Grande, ou qualquer cidadão que apoie o Sporting, está limitado a passear de verde nos arredores do estádio da Luz . Não só é o impedimento ao natural curso da democracia, limitando os cidadãos ao apoio do seu clube e à livre circulação de pessoas, como é uma limitação da própria democracia nos seus direitos.
   No entanto é nos resultados que reside o pior do português ressabiado. O jogo parece ter sido uma batalha campal, estamos limitados aos lances ditos "polémicos", ninguém quer saber qual foi o jogador que brilhou em campo, que equipa se destacou mais na organização de jogo, que lance poderia ter sido chave para a vitória. Ficasse reduzido a um ou outro lance, de cinco a dez minutos, que decide o curso dos comentários, quer nas redes sociais, quer nos programas que abastecem diariamente os canais de noticias.
   A primeira expressão do derrotado - "Esta arbitragem é vergonhosa...". É o costume do fracasso, é o arbitro que paga a factura da má exibição, da má prestação, da falha nas substituições e dos pontas de lança não terem feito o seu trabalho. Sempre preferi ouvir dizer o chavão "eles é que ganham e nós é que nos preocupamos...".
  Os erros de arbitragem são comuns aqui como em qualquer outro país que tenha desporto, nomeadamente o futebol. Salvo casos mais caricatos,  o resto do mundo também tem erros em lances, é natural, são humanos que lá estão. Os erros acontecem, ou a expressão "errar é humano" está fora do futebol?
   Discute-se quarenta minutos em programas de televisões, e publicasse trezentas imagens de puxões, agarrões, caneladas, amarelo ou vermelho que deveria ter sido dado, foras de jogo imaginários, o treinador e o tipo que tá sentado ao lado do treinador. Discute-se aquilo que acontece num qualquer campeonato de excelência, onde é considerado natural, por cá, a febre clubitica considera beneficio. A o mais fanático dos adeptos, que por doença e falha na sanidade, ainda diz que o clube rival só não está na segunda divisão porque a justiça o protege. Fala como o futebol o centro de tudo para todos, exemplificando com a politização só para saciar a ressabia projectada na clubite.
  Num país afundado numa crise de valores morais, os desejos de morte aos adeptos rivais é enorme, acham que o nosso fanatismo pode ser expressivo de qualquer forma. Ameaças, discussões e agressões por diferença de clubes é a visão do fracasso de muita gente que culpa tudo, menos a bola ter entrado na baliza, os jogadores e os falhanços sistemáticos.
   Neste país existe uma dificuldade em ser arbitro, sempre o culpado do fracasso da equipa que foi derrotada, estamos acostumamos a que o nosso fracasso seja culpa de terceiros, e não nossa.
    É a visão natural que o português tem da vida, como tem do futebol.O fracasso é sempre  desculpado com circunstâncias fora do nosso alcance. A culpa é sempre de alguém ou algo, nunca das nossas fraquezas e debilidades. O futebol é a montra de toda a falta de valores sociais, e por vezes humanistas que perdura durante gerações. Do "chico espertismo" convencional ganhamos o "a culpa é do....", e assim vamos vivendo neste cantinho à beira mar plantado, cheio de mazelas.
  Em Portugal, de certeza que a culpa, como o fracasso, não morre solteira, existe sempre alguém que pode nos emprestar as "costas largas".