Direitos Humanos primeiro! - Justiça igual para todos!
Em Janeiro vai ter início uma fortíssima campanha da sociedade civil em toda a Europa.
No dia-a-dia verificamos que as ameaças ambientais se tornam cada vez mais graves e perigosas, que os salários reais estão estagnados, enquanto as desigualdades de riqueza e rendimento se agravam, que a democracia se vai esvaziando e que em muitos países a extrema direita está em clara e ameaçadora ascensão. Estas tendências não são alheias à forma como temos gerido a Globalização.
Os acordos de Comércio e Investimento são os alicerces da globalização. Eles asseguram às multinacionais privilégios que obrigam os estados a pagar pesadas indemnizações quando aprovam legislação (ambiental, laboral, etc.) que ameace os seus lucros.
Por exemplo, em 2009, a companhia sueca Vattenfall iniciou uma acção contra a Alemanha a respeito da construção de uma central a carvão no rio Elba. O governo de Hamburgo aprovou legislação ambiental com o objectivo de proteger a qualidade das águas fluviais, antes ainda de aprovar o contrato final para a construção da central. A Vattenfall alegou que tais exigências iriam tornar o projecto inviável e que isso resultaria numa “expropriação indirecta”: exigia ser indemnizada em 1400 milhões de euros, não pelos danos que tinha sofrido, mas por ver goradas as suas expectativas de lucro. Em 2011, a cidade de Hamburgo acordou em reduzir os seus padrões ambientais para evitar os custos da indemnização. Poucos anos depois, a mesma companhia voltou a mover uma acção contra a Alemanha devido à decisão de abandono da energia nuclear, e fê-lo novamente contornando e ignorando os Tribunais alemães. Muitas vezes este mecanismo tem efeito sem que nenhuma acção seja movida: a mera ameaça é suficiente para intimidar o legislador.
Vale a pena acrescentar que não é apenas a legislação com o objectivo de proteger o meio ambiente ou a saúde pública que pode ser alvo deste tipo de litigância. Ficaram célebres casos em que a subida do salário mínimo foi pretexto para uma acção contra o Egipto, ou o facto do governo não ter evitado uma greve ter sido pretexto para uma acção contra a Roménia. Legislação para proteger serviços públicos, reverter privatizações, alterar a tributação, proteger os consumidores ou a privacidade, entre muitas outras, está sujeita à ameaça destes mecanismos.
Esta tendência tem aumentado de dia para dia, e já chegou a Portugal onde recentemente os accionistas da EDP ameaçaram os contribuintes portugueses com o recurso a estes mecanismos. Abre-se um precedente muito perigoso para as nossas finanças e para a nossa Democracia.
Por outro lado, as multinacionais usufruem de impunidade no palco internacional para várias violações dos Direitos Humanos.
No entanto, existe um movimento cada vez mais alargado de colectivos que quer inverter esta situação. Este movimento inclui associações ambientalistas, sindicatos, e muitas outras associações da sociedade civil tais como associações de defesa dos direitos humanos, associações animalistas, associações de defesa do consumidor, de defesa dos serviços públicos, de defesa do estado de direito, de defesa da saúde, associações de juízes e magistrados, etc.
Este movimento já conseguiu várias vitórias no passado. Conseguiu obter em toda a Europa mais de 3 milhões de assinaturas contra o TTIP (um tratado que iria expandir bastante os privilégios mencionados), mais do que qualquer “Iniciativa de Cidadania Europeia”. Conseguiu que mais de 4000 municípios em toda a Europa se declarassem “zonas livres de TTIP”, e conseguiu trazer milhões de pessoas para as ruas na Alemanha, França, Bélgica, Holanda, entre outros. Mais importante: conseguiu travar o TTIP, cuja assinatura estava planeada para 2015. Unindo-se a outros movimentos que têm alcançado importantes vitórias na luta contra a impunidade das multinacionais, o número de associações envolvidas passou das cerca de 500 em toda a Europa para as cerca de 2000 em todo o mundo.
2019 é um ano decisivo. É um ano em se pode tornar estes sistemas mais impactantes e irreversíveis, acentuando todos os desequilíbrios sociais e ambientais da globalização, ou optar por desmantelar estes sistemas e mudar os assim os alicerces da globalização. É o ano em que podemos juntos começar a construir um mundo diferente.
É essencial que a população europeia esteja a par daquilo que está em discussão e o papel de cada leitor é fundamental. A semana que antecede o lançamento da petição é uma oportunidade única para trazer este tema para o debate público.
Faço um apelo ao leitor a que promova a discussão e o alerta sobre estes assuntos, na medida da sua disponibilidade, vontade e meios.
Informação adicional:
1) Vários exemplos de casos ISDS
2) Sobre o ICS e ISDS
3) Sobre a debilidade dos argumentos pró-ISDS
4) Sobre a ameaça que o ISDS representa para o Estado de Direito
5) Sobre o MIC
6) Sobre a impunidade das multinacionais e possíveis respostas
Texto também publicado no Esquerda Republicana.
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