Uma visão politica sensata
O Partido Socialista conseguiu o apoio parlamentar dos
partidos à sua esquerda, conseguindo formar governo. As diferenças entre as
quatro forças políticas são conhecidas, não fazem questão de as ignorar em nome
estabilidade e consenso politico.
No entanto essas diferenças, em algumas medidas, acentuam-se
de forma mais ou menos rígida, como no caso do BANIF e do Novo Banco, o que fragiliza
a coligação parlamentar perante a oposição, deixando a nu a existência de pontos
fracos que podem ser aproveitados pela direita.
Apesar desses pontos fracos serem uma vantagem, a direita
também se tenta encontrar após um período de fusão entre o PSD e o PP. Ambos os
partidos têm de se ajustar a uma nova realidade, e procurar captar novamente o
seu eleitorado, deixando de parte a “ressaca” de terem perdido o poder, quando julgaram que ao ficarem à frente nas eleições teriam o PS na “algibeira”.
A direita está demasiado confusa. O PP, sucumbido pelo PSD
durante quatro anos, viu o seu líder carismático sair sem glória. Paulo Portas
abandona a presidência do partido após 16 anos, e procura agora um líder que
consiga manter o CDS no expecto politico, e vivo, depois de ter sido absorvido
pelos sociais-democratas durante tanto tempo.
Os quatro anos de governação em coligação levaram o CDS a
perder a sua identidade para o PSD. Paulo Portas sabe disso, sabe que falhou
quanto à defesa daqueles que seriam o maior eleitorado do CDS, os reformados.
No entanto, o CDS absteve-se da sua função como partido, garantir que as suas
promessas fossem cumpridas, o que não aconteceu.
O PSD é agora, sem dúvida, o único partido à direita. Sob a presidência
de Passos Coelho, o PSD deslocou-se do centro politico, onde sempre esteve,
abandonou a Social-democracia vigente, e passou para a direita do
Neoliberalismo, para lá da direita conservadora dos democratas cristãos, o CDS.
Passos Coelho, mesmo assim, consegue agora captar o eleitorado que era do CDS.
Passos Coelho que
teve no seu legado governativo uma série de vitórias morais, e de domínio político.
Dominou Paulo Portas, dominou a coligação e agora domina, na totalidade, a
oposição, sem que o CDS consiga-se levantar. Mesmo no seio do PSD, o domínio da
ala mais à direita é visível. Passos Coelho mantém a máquina do partido do seu
lado, e não tem contestação na imprensa, que apesar de lhe ser austera (zinha)
de vez em quando, está assumidamente do seu lado, e do lado da máquina dos
sociais-democratas.
À esquerda as coisas estão serenas. Mas a história e motivos
da divisão à esquerda são insanáveis. A desconfiança e o eleitorado são os
motivos pelos quais a esquerda se divide mais. O aparecimento de novas forças políticas
obrigou a repensar um plano estratégico novo, para manter a força do eleitorado.
Com esta coligação, mesmo que apenas parlamentar, demonstrou
que as divisões podem ser sanáveis desde que o princípio de todos os partidos
seja a compreensão e a vontade de melhorar a vida das pessoas, e não os motivos
eleitoralistas que governam os partidos.
A CDU é aquele, ao contrário que parecia, mais desconfiado
face aos parceiros de coligação. Apesar de ter um eleitorado fixo, a CDU passou
para trás do Bloco, o que não animou as hostes Comunistas. Mas o PCP é um
partido que pode puxar os seus galões. Além de um partido com uma força
autárquica muito superior à do BE, o PCP também conta com o seu aparelho
sindical, mesmo que esteja em baixo de forma.
O Bloco, que conseguiu um resultado histórico, olha para o
eleitorado à esquerda do PS como sendo o “seu” eleitorado, que conquistou nas últimas
eleições. Apesar de mérito de Catarina Martins, os factores externos ao partido
também foram favoráveis ao resultado.
Foi o BE, talvez, o único vencedor da noite de quatro de
Outubro. O PS saiu derrotado, quando tudo apontava ser o vencedor natural após
quatro anos de (des) governação da direita. A coligação, que muitos apontam
como vencedora, agregou duas forças politica, que quatro anos antes tinham
chegado à maioria, mas ficaram a quatro pontos percentuais do PS. A CDU cai
para quinto partido, quando foi sempre a terceira força politica mais
representada no parlamento.
As divisões à esquerda favorecem mais o PCP do que o Bloco,
quando falamos de eleitorado. O PCP tem poucas forças políticas para onde o seu
eleitorado pode fugir. Os partidos da génese comunista, como o PCTP-MRPP e o
4Pous, não têm força suficiente, e divergem no essencial do que o eleitor
comunista quer.
No que toca ao Bloco, as forças politicas têm maior
capacidade de absorção do seu eleitorado. O LIVRE, que foi inúmeras vezes “mal
tratado” pela imprensa, pode captar os militantes que assumidamente pedem uma
governação à esquerda com o PS. O LIVRE, apesar do resultado ter sido pouco
expressivo, é o que pode concentrar mais os votos da esquerda do PS, podendo
ainda contar com a captação do eleitorado da abstenção. O Livre, foi por
diversas vezes, a fonte de inspiração do Bloco, com um pequeno à parte, não
tinha uma imprensa tão forte como o Bloco teve.
O PS, que supostamente era o grande derrotado do dia quatro,
sai como vencedor, por cima da coligação, que se inspira nos piores momentos da
história da humanidade e da história do país para acusar o PS de “golpada”.
A coligação que se exaltou durante dias, que quis governar
não tendo maioria, e a quem o nervosismo impediu um discernimento sério sobre a
realidade à sua volta.
António Costa transporta o partido para a sua génese de
esquerda, mantendo o eleitorado de centro (assim dizem as sondagens se
acreditarmos), e poderá sair favorecido numa derrapagem dos partidos da
coligação parlamentar de esquerda. António Costa pode, sem querer, ter uma
maioria absoluta e reduzir BE e PCP no seu eleitorado caso exista novas
eleições, e caso essas eleições sejam provocadas por um dos parceiros da
coligação. Costa ainda pode contar com o eleitorado da direita, se o CDS e o
PSD estiveram dentro de uma política eleitoralista, se colocarem o partido à
frente do país, e se o PSD não desgrudar de uma direita que o fez perder 12%
dos votos obtidos em 2011.
Apesar de o tom sereno com que o país se depara neste
momento, creio que o clima politico/partidário vai estar quente durante esta
legislatura, e a direita não via deixar escapar os erros da esquerda, nem a
esquerda vai querer novamente a direita no poder. Com isto tudo, o Partido
Socialista vai tendo margem de manobra suficiente para poder cumprir o seu programa,
sem desculpas que foram as circunstancias eleitorais que não o permitiram.